16 de dezembro de 2008


Na hora em que você enviou aquela mensagem, eu estava trancada no banheiro. Tenho medo de armários abertos em quartos escuros e tenho medo de defesa de tese. Minhas melhores amigas resolviam os últimos detalhes. Uma delas tentava instalar os equipamentos, a outra trazia mais cadeiras para a sala que se fazia cada vez mais cheia. Mais tarde eu anunciei: estas são as salas do imaginário, sempre repletas de pessoas do bem.

Quando vieram me chamar, eu não estava pronta, nunca estive. Morena ao meu lado, como sempre, uma criança e esta força. A faxineira entrou com vassoura no banheiro e me disse: estou encantada, sou maranhense. Conversando com ela, relembrei o sentido do meu trabalho: estas pessoas. Abracei-a e pedi: assiste um pouco. Mas ela não podia, a chefe do departamento de limpezas não permitia. Fiz força para lembrar o quanto tive e tenho sorte, mas toda a minha família, meus pais, meus amigos, meus professores mais queridos e aqueles que considerei mais importantes para o assunto sentados na banca não me consolavam nesta hora. Eram inclusive a razão do meu pavor. Dois dos meus principais mestres de fora da academia estavam lá, um deles de terno e gravata, muito solene. O outro de calça jeans e máquina fotográfica na mão, lindo e encantador.

Na hora que você apertou o send de sua querida mensagem, minha amiga me buscou no banheiro. Na verdade, não tive forças para fugir, que era bem a minha vontade. Dei de cara com meu orientador, me abraçou, quanta sorte no mundo uma pessoa pode ter.

Você enviou um e-mail avisando que não poderia estar. Mas se estivesse, ficaria de pé na porta, ao lado de meus primos sempre gentis e bem educados como toda família, para ceder lugar aos mais velhos. Ou sentaria em um canto no chão, como minhas amigas, para que eu ouvisse bem que respiravam emocionadas ao meu lado.

Mas subitamente, cresci como um Caboclo de Pena, daqueles bem grandes. Com a ajuda de guias e encantados, instaurou-se um clima generoso, acolhedor, confortante e bonito. Uma catarse coletiva para o bem do mundo, para o saber dos mestres populares. Uma poética do imaginário viva, pulsante e real.
Se você estivesse ali, teria ficado muito orgulhoso, como todos. Teria chegado perto para saber se estava tudo bem comigo, como fez Morena, na hora que lágrimas escorreram de meu rosto. Teria talvez distribuído lenços de papel para a banca de professores como fez a Pati. Teria tirado fotos, como fez o meu babá. Talvez tivesse até cantado, como fez Tião.

Teu parabéns chegou antes da hora. Muito mais tarde, ganhei abraços queridos, os melhores de minha vida. Tanto tempo trancada dentro de casa, achei que não teria mais amigos, que as pessoas queridas haviam de me esquecer, porque foram sucessivas ausências em casamentos, aniversários e outros eventos de menor porte. Mas ali tudo se diluiu em uma atmosfera maravilhosa. Seu Sete perguntou, alguns dias depois, se eu havia entendido o sentido do que havia acontecido ali naquela sala. E explicou: Dona Moça, houve uma diluição de fronteiras, a razão e a emoção eram uma só. A ciência objetiva e a razão sensível subjetiva estiveram unidas, fraternalmente e isso, apesar de ser uma tendência da humanidade (a dissolução de dicotomias tão bem delimitadas), na verdade exige coragem, coragem e esforço, daqueles que vão à frente, por isso todos choraram copiosamente, longamente, subitamente confortados em um espaço onde se operava esse acontecimento, com permissividade saudável.

Perguntaram ao meu amigo: “e como esteve Morena nesta hora?” Ele respondeu: “esteve maravilhosa e inteira. Ajudou a organizar, ajudou a fechar, esteve ao lado da mãe, forte, dando suporte emocional e afetivo. Morena foi e é admirável.”

E eu? Eu sou abençoada. Sou doutora curadora de boi. Professora e brincante de burra, levando índia menina pela mão, divertida.

Em você, um beijo com saudades da gente. Tudo de verdade verdadeira.

4 de dezembro de 2008

Saiu, finalmente. Tião, Pati e eu escrevemos os textos. Leandro desenhou. Morena canta e dança. Em todo canto. Viva. A vida é bonita e colorida.

3 de dezembro de 2008

Em épocas de grandes acontecimentos, muitas vezes externos a nós mesmos, vamos certificando - mulher grande - e ensinando menina pequena: os amigos de outros tempos, a família, o que construímos - é tudo o que temos de mais importante. Numa hora como essa, eu sem amigos não seria ninguém. Está vendo bem isso, Morena?